Não vou mentir,
eu saí,
saí e estava frio lá fora,
saí do quarto empoeirado,
já passava das dez.
fui remoer ideias
longe da bagunça,
longe da loucura organizada,
procurando algum balcão.
fui me demolir ao vento.
não vou mentir,
eu bebi um pouco,
duas ou treze
doses
bebi em taças de cristal
bebi em copos de requeijão
estava feliz
por um momento...
eu parecia feliz
meu corpo estava contente,
dopado o bastante
anestesiado o bastante
mesmo que nunca parecesse o bastante
estava me programando para não sentir a pressão
de ser esmagado abismo a dentro
quem dera
não sentir nada.
voltei,
caminhei por trinta minutos
até a próxima quadra,
já passava das três,
não existe muita coisa às três;
latidos
murmúrios
zumbidos
buzinas distantes
ladrões
insetos confundindo
as luzes da rua
com a lua,
e algum trouxa insone
caminhando sozinho enquanto
carrega seus pedaços pela calçada,
há sempre alguém
criando mosaicos de si mesmo
com um pouco de ódio entre as peças
criando esperança
entre lágrimas e vômito
após uma alegria passageira,
há sempre alguém
tentando lembrar
o caminho de volta
por se sentir
perdido
entre os copos mágicos
que fazem esquecer
mas dessa vez
por mais que eu quisesse
não havia um caminho
para lembrar
não havia um caminho
que me levasse
pra onde eu desejava estar
então voltei pra casa,
queria que estivesse lá.